16 janeiro, 2014

A passagem


"Como será que é morrer?"
Ainda meio zonza do sono, sentia essa pergunta no fundo da língua. Pronta para se desenrolar. Coisa diferente, sensação primeira. E pela primeira vez, senti medo da morte, de morrer. Por sentir uma solidão furiosa, não há nada no momento da morte, talvez. Nada para se apoiar, nem tentar se agarrar. Então abri os olhos e vi as duas cadeiras marrons, o tapete e a tv ligada. Não estou nem um pouco interessada em pendurar meu par de tênis... talvez esse assunto começou por ler ontem a noite sobre o assassinato de alguém ou pela conversa de como foi a morte da minha mãe. Acordei e lembrei de tantas coisas que se passaram entre nós, das conversas que eu achava inúteis e ela vivia me dizendo: "um dia você vai entender" ou "quando você estiver no meu lugar vai saber". E só agora começo a me dar conta de praga de mãe pega mesmo. Se eu sinto falta dela? sim. Gostaria de poder fazer perguntas que jamais sonhei em dizer... não era mais questões do tipo: ô mãe, por que 4+2 é = a 6 e não um passarinho de cor laranja cantando? são coisas sobre a vida. Perguntar quantas vezes sentiu medo de arriscar, quantas vezes perdoar alguém, estender a mão uma vez mais ou virar as coisas e não olhar para trás, se ela tinha muitos arrependimentos, o que fez ela feliz por todos os anos que viveu... coisas bregas. Tenho a real sensação de que flutuo como um dente de leão, ao sabor do vento. A haste que me prendia era ela, única. Já não tenho mais.. o vento soprou pra longe e hoje vagueio por aí, sem destino certo. Relatando essa sensação à uma colega, ela disse algo que faz totalmente sentido: " lar é a pessoa, não a casa". É isso. Perdi meu lar. Onde moro, pareço ser estrangeira. Na verdade sou estrangeira em todos os locais que vou, não importa se é na casa do meu pai, da minha avó, ou na minha antiga casa. Não me encaixo algum local e aí a saudade aperta o coração e faz os olhos soltarem algumas lágrimas. Ando chorando com frequência, dormindo depois das três da manhã. Desde muito pequena fazia umas perguntas muito estranhas para a minha idade e isso só continua piorando. Quando será que toda essa minha pólvora vai queimar por inteiro e eu finalmente vou cessar? Amo andar pelo mundo [seja do lado de fora ou de dentro da minha casca] mas preciso de uma pausa; 2 ou 3 compassos? pois é. É nessas horas que sinto falta do abraço da minha mãe. Frio queima a gente.... eu já não consigo mais endurecer meu coração como antes e me dói tanto. Sei que vou ser eternamente magoada dessa maneira mas fazer o quê? Amor é assim mesmo, a gente jamais desiste. Mesmo não estando mais perto... obrigada por não ter desistido de mim mãe.

Um comentário:

Bela disse...

Quando comecei a ler o texto, fiquei impressionada, parece que as palavras tinham saído de mim. Mesmo.
Me emocionei bastante com tudo que escreveu, eu sempre pensei exatamente do jeito que você pensa agora. Eu te desejo, do fundo do meu coração: conforto e paz. E que um dia você também possa ser o lar de alguém, se é que me entende.
Se cuida. :)